"O amor, quando se revela, não se sabe revelar. Sabe bem olhar pra ela, mas não lhe sabe falar."
Fernando Pessoa
sexta-feira, 4 de março de 2011
Aulas sobre contratos
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http://www.youtube.com/watch?v=ir0ogaHRUm4&feature=related Aula 1 - parte 3
http://www.youtube.com/watch?v=-Uq-fMrBI5U&feature=related Aula 1 - parte 4
quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011
5. FORMAÇÃO DO CONTRATO - Carlos Roberto Gonçalves
terça-feira, 15 de fevereiro de 2011
Licitações - Maria Sylvia Zanella Di Pietro
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Homicídio - Rogerio Greco
– Homicídio
Homicídio privilegiado:
Na verdade, a expressão “homicídio privilegiado”, embora largamente utilizado pela doutrina e pela jurisprudência, nada mais é do que uma causa especial de redução de pena.
Classificação doutrinária:
Crime comum, simples, de forma livre (como regra, pois existem modalidades qualificadas que indicam os meios e modos para a prática do delito, como ocorre nas hipóteses dos incisos III e IV), podendo ser cometido dolosa ou culposamente, comissiva ou omissivamente (nos casos de omissão imprópria, quando o agente usufruir status de garantidor), de dano, material, instantâneo de efeitos permanentes, não transeunte, monossubjetivo, plurissubsistente, podendo figurar, também a hipótese de crime de ímpeto (como no caso da violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima).
Sujeito ativo e sujeito passivo:
Sujeito ativo do delito de homicídio pode ser qualquer pessoa. 2 Sujeito passivo, da mesma forma, também pode ser qualquer pessoa.
Somente haverá homicídio se, ao tempo da ação ou da omissão, a vítima se encontrava com vida, pois, caso contrário, estaremos diante da hipótese de crime impossível, em razão da absoluta impropriedade do objeto.
A Lei de Segurança Nacional (Lei n. 7.170/83) especializou o homicídio no que diz respeito ao seu sujeito passivo, cominando pena de reclusão, de 15 a 30 anos, nas hipóteses de serem vítimas de homicídio o Presidente da República, do Senado Federal, da Câmara dos Deputados ou do Supremo Tribunal Federal, conforme se verifica da leitura de seu art. 29.
Objeto material e bem juridicamente protegido:
Objeto material do delito é a pessoa contra qual recai a conduta praticada pelo agente.
Bem juridicamente protegido é a vida e, num sentido mais amplo, a pessoa.
O direito à vida não é absoluto, pois que a CR/88, mesmo que excepcionalmente, permitiu a pena de morte, nos casos de guerra declarada, nos termos do seu art. 84, XIX.
Se não bastasse, ainda existem em favor do agente que elimina a vida de seu semelhante as causas de justificação, a exemplo do estado de necessidade e da legítima defesa, como ainda algumas dirimentes, como acontece nas hipóteses em que era exigível um outro comportamento do agente.
A prova da vida é indispensável à caracterização do homicídio.
Pelas lições de Hungria, iniciado o parto (normal ou cesárea), comprovada a vitalidade do nascente, ou seja, aquele que está nascendo, ou do neonato, isto é, o que acabou de nascer, já podemos pensar, em termos de crimes contra a vida, no delito de homicídio, ou, caso tenha sido praticado pela gestante, sob a influência do estado puerperal, o crime de infanticídio.
No que diz respeito à possibilidade de ocorrência do delito de homicídio, ainda, havendo vida intra-uterina, mesmo depois de já ter sido iniciado o parto, existe divergência em nossa doutrina.
Cezar Roberto Bitencourt, com precisão, esclarece: “A vida começa com o início do parto, com o rompimento do saco amniótico; é suficiente a vida, sendo indiferente a capacidade de viver. Antes do início do parto, o crime será de aborto. Assim, a simples destruição da vida biológica do feto, no início do parto, já constitui o crime de homicídio”.
Em sentido contrário, Ney Moura Teles afirma que “homicídio é a destruição da vida humana extra-uterina, praticada por outro ser humano”.
Acreditamos não haver necessidade de vida extra-uterina para que se possa falar em homicídio.
Com a morte encerra-se a proteção pelo art. 121 do CP. A Lei n. 9434/97, que dispõe sobre a remoção de órgãos, tecidos e partes do corpo humano para fins de transplante e tratamento, especifica, em seu art. 3º, que a morte se dá quando da morte encefálica comprovada e atestada por dois médicos; embora outros órgãos estejam em funcionamento, estando comprovada a morte encefálica, a pessoa não poderá ser sujeito passivo do crime de homicídio.
Exame de corpo de delito:
Em se tratando de crime material, infração penal que deixa vestígios, o homicídio, para que possa ser atribuído a alguém, exige a confecção do indispensável exame de corpo de delito, direto ou indireto, conforme determinam os arts. 158 e 167 do CPP.
Conforme esclarece Eugênio Pacelli de Oliveira, “deixando vestígios a infração, a materialidade do delito e/ou a extensão de suas conseqüências deverão ser objeto de prova pericial, a ser realizada diretamente sobre o objeto material do crime, o corpo de delito, ou, não mais podendo sê-lo, pelo desaparecimento inevitável do vestígio, de modo indireto. O exame indireto será feito também por meio de peritos, só que a partir de informações prestadas por testemunhas ou pelo exame de documentos relativos aos fatos cuja existência se quiser provar, quando então se exercerá e se obterá apenas um conhecimento técnico por dedução”.
Somente na ausência completa de possibilidade de realização do exame de corpo de delito, seja ele direto ou indireto, é que a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta, nos termos preconizados pelo art. 167 do CPP.
Elemento subjetivo:
O elemento subjetivo constante do caput do art. 121 do CP é o dolo, ou seja, a vontade livre e consciente de matar alguém. O agente atua com o chamado animus necandi ou animus occidendi.
Admite-se que o delito seja cometido a título de dolo direto ou eventual.
Pode ocorrer, portanto, o homicídio, tanto a título de dolo direto, seja ele de primeiro ou de segundo graus, como eventual.
Obs: A fórmula criada, ou seja, “embriaguez + velocidade excessiva = dolo eventual” não pode prosperar. O CP não adotou a teoria da representação, mas sim a da vontade e a do assentimento. Exige-se, portanto, para a caracterização do dolo eventual, que o agente anteveja como possível o resultado e o aceite, não se importando realmente com a sua ocorrência.
Com isso queremos salientar que nem todos os casos em que houver a fórmula “embriaguez + velocidade excessiva” haverá dolo eventual. Também não estamos afirmando que não há possibilidade de ocorrer tal hipótese. Só a estamos rejeitando como uma fórmula matemática, absoluta.
Modalidades comissiva e omissiva:
Pode o delito ser praticado comissivamente, quando o agente dirige sua conduta com o fim de causar a morte da vítima, ou omissivamente, quando deixa de fazer aquilo a que estava obrigado em virtude da sua qualidade de garantidor (crime omissivo impróprio).
Homicídio privilegiado:
O §1º, do art. 121 do CP cuida do chamado homicídio privilegiado. Trata-se de uma causa especial de diminuição de pena, aplicada às hipóteses nele previstas.
O mencionado parágrafo cuida de duas situações distintas. Na sua primeira parte, a minorante será aplicada quando o agente comete o crime impelido por motivo de relevante valor social ou moral. Na segunda parte, age sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida a injusta provocação da vítima.
Embora a lei diga que o juiz pode reduzir a pena, não se trata de faculdade do julgador, senão direito subjetivo do agente em ver diminuída sua pena, quando o seu comportamento se amoldar a qualquer uma das duas situações elencadas pelo parágrafo.
a) Motivo de relevante valor social ou moral → Primeiramente, o motivo que impeliu o agente a praticar o homicídio deve ser relevante. Relevante valor social é aquele motivo que atende aos interesses da coletividade. Ex: a morte de um traidor da pátria, no exemplo clássico da doutrina. Relevante valor moral é aquele que, embora importante, é considerado levando em conta os interesses do agente. Ex: o pai que mata o estuprador de sua filha; as hipóteses de eutanásia também se amoldam à primeira parte do §1º do art. 121 do CP.
b) Sob o domínio de violenta emoção, logo em seguida à injusta provocação da vítima → Quando a lei penal usa a expressão “sob o domínio”, isso significa que o agente deve estar completamente dominado pela situação. Caso contrário, se somente agiu influenciado, a hipótese não será de redução de pena em virtude da aplicação da minorante, mas tão somente de atenuação, face a existência da circunstância prevista na alínea „c‟, do inciso III, do art. 65 do CP.
A punição daquele que atua sob o domínio de violenta emoção se compatibiliza com a regra contida no inciso I do art. 28 do CP, que diz não excluir a imputabilidade penal a emoção ou a paixão.
A expressão “logo em seguida” denota relação de imediatidade, de proximidade com a provocação injusta a que foi submetido o agente.
Finalmente, merece destaque, também, a locução “injusta provocação”. Prima facie, devemos distinguir o que vem a ser injusta provocação, que permite a redução de pena, da chamada injusta agressão, que conduzirá ao completo afastamento da infração penal, em virtude da existência de uma causa de justificação, vale dizer, a legítima defesa. Já tivemos oportunidade de salientar, quando do estudo da legítima defesa, que é importantíssima: a distinção entre agressão injusta e provocação. Isso porque se considerarmos o fato como injusta agressão caberá a argüição da legítima defesa, não se podendo cogitar da prática de qualquer infração penal por aquele que se defende nessa condição; caso contrário, se entendermos como uma simples provocação, contra ela não poderá ser alegada a excludente em benefício do agente, e ele terá que responder penalmente pela sua conduta.
Homicídio qualificado:
É importante frisar, nessa oportunidade, que o §2º do art. 121 do CP prevê uma modalidade de tipo derivado qualificado. Quer isto significar que todas as qualificadoras devem ser consideradas como circunstâncias, e não como elementares do tipo. Tal raciocínio se faz mister pelo fato de que o art. 30 do CP determina: “Não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter pessoal, salvo quando elementares do crime”.
Dessa forma, embora duas pessoas possam, agindo em concurso, ter causado a morte de alguém, uma delas poderá ter praticado o delito impelida por um motivo fútil, não comunicável ao co-participante.
Entendemos que, toda vez que os tipos penais estiverem ligados entre si pelos seus parágrafos, estaremos sempre diante dos chamados tipos derivados, e não de delitos autônomos.
I - Motivos: Mediante paga ou promessa de recompensa, ou por outro motivo torpe; motivo fútil:
A lei penal aponta que tanto a paga quanto a promessa de recompensa são considerados motivos torpes. Torpe é o motivo que contrasta violentamente com o senso ético comum. A paga é o valor ou qualquer outra vantagem, tenha ou não natureza patrimonial, recebida antecipadamente, para que o agente leve a efeito a empreitada criminosa. Já na promessa de recompensa, o agente não recebe antecipadamente, mas sim existe uma promessa de pagamento futuro.
Afirmamos que a paga e a promessa de recompensa não necessitam possuir natureza patrimonial. Parte da doutrina se posiciona contrariamente a esse entendimento. Trazemos à colação as lições de Luiz Regis Prado: “Questiona-se se a recompensa visada limita-se à retribuição de ordem econômica ou se o legislador também albergou, no presente dispositivo, a contraprestação sem valor patrimonial. Predomina o entendimento segundo o qual a recompensa deve ter, para a configuração da qualificadora, conteúdo econômico. Acertada a posição dominante que considera que a paga ou a promessa de recompensa devam ter conteúdo econômico. Pode o juiz, porém, avaliar o motivo não-econômico quando da fixação da pena-base (art. 59, CP)”. Ainda, com relação à promessa de recompensa, merece destaque o fato de que o agente responderá por esse delito mesmo que não a receba após o cometimento do crime e ainda que o mandante não tivesse a intenção, desde o início, de cumpri-la. A raiz do homicídio está na motivação, razão pela qual, ainda assim, o delito será qualificado.
Se existiu a paga ou a promessa de recompensa, é sinal de que alguém pagou ou prometeu a vantagem para que outra pessoa praticasse o homicídio. Existem, portanto, sempre dois personagens pelo menos: mandante e executor. Deverá o mandante responder, também, pelo homicídio qualificado pelo simples fato de ter prometido vantagem para que alguém o praticasse? Entendemos que não. Isto porque, como já esclarecemos acima, todas as qualificadoras devem ser consideradas como circunstâncias. Aquele que recebe a paga ou aceita a promessa de recebimento da vantagem para que pratique o homicídio, o faz por um motivo torpe. Pode ser, inclusive, que o mandante possuía um motivo de relevante valor moral, que não se confundirá com aquele que motivou o executor a cometer o homicídio.
O inciso II do §2º do art. 121 do CP prevê, também, a qualificadora do motivo fútil. Fútil é o motivo insignificante, que faz com que o comportamento do agente seja desproporcional. Motivo fútil é aquele onde há um abismo entre a motivação e o comportamento extremo levado a efeito pelo agente.
A doutrina aponta, ainda, para o fato de que crime sem motivo não se configura motivo fútil. Nesse sentido, afirma Damásio de Jesus: “se o sujeito pratica o fato sem razão alguma, não incide a qualificadora, nada impedindo que responda por outra, como é o caso do motivo torpe”.
Com a devida vênia das posições em contrário, não podemos compreender a coerência desse raciocínio. Tal fato não passou despercebido por Fernando Capez, quando afirmou que “matar alguém sem nenhum motivo é ainda pior do que matar por mesquinharia, estando, portanto, incluído no conceito de fútil”.
Tratando-se de homicídio com duas ou mais qualificadoras, como veremos mais à frente, poderá qualquer uma delas servir para qualificar a infração penal, sendo que as demais serão utilizadas como circunstâncias agravantes, no segundo momento de aplicação da pena, determinado pelo art. 68 do CP.
II - Meios: Com emprego de veneno, fogo, explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum:
Tudo aquilo que for considerado meio insidioso, cruel ou de que possa resultar perigo comum qualificará o homicídio, a exemplo das hipóteses mencionadas expressamente pelo inciso III (veneno, fogo, explosivo, asfixia e tortura).
De acordo com a interpretação que se faz do mencionado inciso III, quando a lei faz menção à sua fórmula genérica, usa, inicialmente, a expressão “meio insidioso”, dando a entender que o veneno, para que qualifique o delito mediante esse meio, deverá ser ministrado insidiosamente, sem que a vítima perceba que faz a sua ingestão. Caso contrário, ou seja, caso a vítima venha a saber que morrerá pelo veneno, que é forçada a ingerir, o agente deverá responder pelo homicídio, agora qualificado pela fórmula genérica do meio cruel. Se a vítima sabe se trata de substância venenosa e a ingere sob coação, a insídia é substituída pela crueldade e a qualificação persiste.
A tortura também encontra-se no rol dos meios considerados cruéis, que têm por finalidade qualificar o homicídio. Importa ressaltar que a tortura, qualificadora do homicídio, não se confunde com aquela prevista pela Lei n. 9.455/97. Qual a diferença, portanto, entre a tortura prevista como qualificadora do delito de homicídio e a tortura com resultado morte prevista pela Lei n. 9455/97? A diferença reside no fato de que a tortura, no art. 121, é tão-somente um meio para o cometimento do homicídio. É um meio cruel de que se utiliza o agente, com o fim de causar a morte da vítima. Já na Lei n. 9.455/97, a tortura é um fim em si mesma. Se vier a ocorrer o resultado morte, este somente poderá qualificar a tortura a título de culpa. Isso significa que a tortura qualificada pelo resultado morte é um delito eminentemente preterdoloso.
III - Modos: À traição, de emboscada, ou mediante dissimulação ou outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido:
O inciso IV do §2º do art. 121 do CP também se valendo do recurso da interpretação analógica, assevera que a traição, a emboscada, a dissimulação ou qualquer outro recurso que dificulte ou torne impossível a defesa do ofendido também qualificarão o homicídio.
IV - Fins: Para assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou a vantagem de outro crime:
Isso significa que, toda vez que for aplicada a qualificadora em estudo, o homicídio deverá ter relação com outro crime, havendo, outrossim, a chamada conexão.
Diz-se teleológica a conexão quando se leva em consideração o fim em virtude do qual é praticado o homicídio. Será considerada teleológica a conexão de outro crime se o homicídio é cometido para que se assegure a execução de um crime futuro.
Conseqüencial é a conexão em que o homicídio é cometido com a finalidade de assegurar a ocultação ou a vantagem de outro crime. Aqui o delito de homicídio é praticado com vistas a ocultar, assegurar a impunidade ou a vantagem de um crime já cometido.
Com relação às qualificadoras contidas no inciso V em exame, devem ser ressaltadas as seguintes indagações:
a) Se o agente comete o homicídio com o fim de assegurar a execução de outro crime que, por um motivo qualquer, não vem a ser praticado, ainda deve subsistir a qualificadora? Sim, haja vista a maior censurabilidade do comportamento daquele que atua motivado por essa finalidade.
b) Se o agente comete o homicídio a fim de assegurar a ocultação ou a impunidade de um delito já prescrito, também subsiste a qualificadora? Sim, pelas mesmas razões apontadas acima.
c) Se o agente pratica o homicídio para assegurar, em tese, a impunidade de um crime impossível, segundo Damásio, “a qualificadora subsiste, uma vez que o Código pune a maior culpabilidade do sujeito, revelada em sua conduta subjetiva”.
d) E se o homicídio é cometido com o fim de assegurar a execução, a ocultação, a impunidade ou a vantagem de uma contravenção penal? Em virtude da proibição da analogia in malam partem, não se pode ampliar a qualificadora a fim de nela abranger, também, as contravenções penais, sob pena de ser violado o princípio da legalidade em sua vertente do nullum crimen poena sine lege stricta, podendo o agente, entretanto, dependendo da hipótese, responder pelo homicídio qualificado pelo motivo torpe ou fútil.
Competência para julgamento do homicídio doloso:
Pelo que se verifica através da alínea „d‟ do inciso XXXVIII do art. 5º da CR/88, o Tribunal do Júri é o competente para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida, destacando-se dentre eles o homicídio, em todas as suas modalidades (simples, privilegiada e qualificada).
Questão importante a ser observada é a que diz respeito ao fato de não ser o latrocínio julgado pelo Júri, mesmo que a morte da vítima seja dolosa.
Merece observar que a CR/88 não impediu que outras infrações penais fossem submetidas a julgamento pelo Tribunal do Júri, mas tão-somente garantiu que os crimes dolosos contra a vida fizessem, sempre, parte desse rol, podendo o legislador infraconstitucional agregar-lhe outros delitos, ampliando-se, portanto, a sua competência.
Homicídio culposo:
Percebe-se que, no crime culposo, estamos diante da hipótese, como regra, do chamado tipo aberto. Na criação dos tipos penais, pode o legislador adotar dois critérios. O primeiro consiste na descrição completa do modelo de conduta proibida. Tal critério conduz à construção dos denominados “tipos fechados”. O segundo critério consiste na descrição incompleta do modelo de conduta proibida, transferindo-se para o intérprete o encargo de completar o tipo, dentro dos limites e das indicações nele próprio contidas. São os denominados “tipos abertos”, como se dá em geral nos delitos culposos que precisam ser completados pela norma geral que impõe a observância do dever de cuidado.
Outra característica de fundamental importância à configuração do delito culposo é a aferição da previsibilidade do agente. Se o fato escapar totalmente à sua previsibilidade, o resultado não lhe pode ser atribuído, mas sim ao caso fortuito ou à força maior.
Faz a doutrina distinção, ainda, entre a previsibilidade objetiva e a previsibilidade subjetiva. Previsibilidade objetiva seria aquela, conceituada por Hungria, em que o agente, no caso concreto, deve ser substituído pelo chamado “homem médio, de prudência normal”. Se, uma vez levada a efeito essa substituição hipotética, o resultado ainda assim persistir, é sinal de que o fato havia escapado ao seu âmbito de previsibilidade, porque dele não se exigia nada além da capacidade normal dos homens.
Além da previsibilidade objetiva, existe aquela outra, denominada previsibilidade subjetiva. Nesta, não existe substituição hipotética; não há a troca do agente pelo homem médio para saber se o fato escapava ou não à sua previsibilidade. Aqui, na previsibilidade subjetiva, o que é levado em consideração são as condições pessoais do agente, quer dizer, considera-se, na previsibilidade subjetiva, as limitações e as experiências daquela pessoa cuja previsibilidade está se aferindo em um caso concreto. Na precisa lição de Damásio: “não se pergunta o que o homem prudente deveria fazer naquele momento, mas sim o que era exigível do sujeito nas circunstâncias em que se viu envolvido”.
Noção de Contratos e princípios - Carlos Roberto Gonçalves
CAPÍTULO I
NOÇÃO GERAL DE CONTRATO
1. CONCEITO
Contrato é fonte de obrigação. Fonte é o fato que dá origem a esta, de acordo com as regras de direito. Os fatos humanos que o Código Civil brasileiro considera geradores de obrigação são:
a) os contratos;
b) as declarações unilaterais da vontade;
c) os atos ilícitos, dolosos e culposos.
Como é a lei que dá eficácia a esses fatos, transformando-os em fontes diretas ou imediatas, aquela constitui fonte mediata ou primária das obrigações. É a lei que disciplina os efeitos dos contratos, que obriga o declarante a pagar a recompensa prometida e que impõe ao autor do ato ilícito o dever de ressarcir o prejuízo causado. Há obrigações que, entretanto, resultam diretamente da lei, como a de prestar alimentos (CC, ár-t. 396), a de indenizar os danos causados por seus empregados (CC, art. 1.521, 111), a propter rem imposta aos vizinhos etc. O Código Civil disciplina dezesseis espécies de contratos nominados e duas de declarações unilaterais da vontade: o título ao portador e a promessa de recompensa (CC; arts. 1.505 a 1.517). Contém ainda um capítulo referente às obrigações por atos ilícitos (CC, arts. 1.518 a 1.553). Começaremos o estudo pelo contrato, que é comumente conceituado, desde Beviláqua, como o acordo de vontades que tem por fim criar, modificar ou extinguir direitos. Constitui o mais expressivo modelo de negócio jurídico bilateral.
2. CONDIÇÕES DE VALIDADE
Os requisitos ou condições de validade dos contratos são de duas espécies: a) de ordem geral, comuns a todos os atos e negócios jurídicos, como a capacidade do agente, o objeto lícito e a forma prescrita ou não defesa em lei (CC, art. 82); b) de ordem especial, específicos dos contratos: o consentimento recíproco ou acordo de vontades.
A capacidade dos contratantes é, pois, o primeiro requisito (condição subjetiva) de ordem geral para a validade dos contratos. Estes serão nulos (art. 145, 1) ou anuláveis (art. 147, 1) se a incapacidade, absoluta ou relativa, não for suprida pela representação ou pela assistência (CC, art. 84).
O objeto do contrato há de ser lícito, isto é, não atentar contra a lei, a moral ou os bons costumes (condição objetiva). Quando é imoral, os tribunais por vezes aplicam o prin cípio de direito de que ninguém pode valer-se da própria torpeza (nemo auditur propriam turpitudinem allegans). Tal princípio é acolhido pelo legislador nos arts. 97, que trata do dolo ou torpeza bilateral, e 971 do Código Civil, que proíbe a repetição do pagamento feito para obter fim ilícito, imoral ou proibido por lei. Além de lícito, o objeto do contrato deve ser, também, possível. Com efeito, o art. 145, 11, do Código Civil declara nulo o negócio jurídico quando for ilícito, ou impossível, o seu objeto. A impossibilidade da prestação pode ser física ou jurídica. A primeira é a que emana de leis físicas ou naturais. Deve ser absoluta, isto é, atingir a todos, indistintamente (p. ex., a de colocar a água dos oceanos em um copo d'água). A relativa, que atinge o devedor mas não outras pessoas, não constitui obstáculo ao negócio jurídico (CC, art. 1.091). Impossibilidade jurídica do objeto ocorre quando o ordenamento proíbe negócios a respeito de determinado bem, como a herança de pessoa viva (CC, art. 1.089), as coisas fora do comércio etc. A ilicitude do objeto é mais ampla, pois abrange os contrários à moral e aos bons costumes. O objeto do contrato, por fim, deve ter algum valor econômico. Um grão de areia, por exemplo, não interessa ao mundo jurídico, por não suscetível de apreciação econômica. Deve ser, também, "determinado ou determinável" (CC, projeto aprovado no Senado em 26-11- 1997, art. 104, II).
O terceiro requisito de validade do negócio jurídico é a forma (forma dat esse rei, ou seja, a forma dá ser às coisas). Deve ser a prescrita ou não defesa em lei. Em regra, a forma é livre. As partes podem celebrar o contrato por escrito, público ou particular, ou verbalmente, a não ser nos casos em que a lei, para dar maior segurança e seriedade ao negócio, exija a forma escrita, pública ou particular (CC, art. 129). Em alguns casos a lei reclama também a publicidade, mediante o sistema de Registros Públicos (CC, art. 135).
O requisito de ordem especial, próprio dos contratos, é o consentimento recíproco ou acordo de vontades. Deve ser livre e espontâneo, sob pena de ter a sua validade afetada pelos vícios ou defeitos do negócio jurídico: erro, dolo, coação, simulação, fraude e lesão. A manifestação da vontade, nos contratos, pode ser tácita, quando a lei não exigir que seja expressa (CC, art. 1.079). Expressa é a exteriorizada verbalmente, por escrito, gesto ou mímica, de forma inequívoca. Algumas vezes a lei exige o consentimento escrito como requisito de validade da avença. É o que ocorre na atual Lei do Inquilinato (Lei n. 8.245/91), cujo art. 13 prescreve que a sublocação e o empréstimo do prédio locado dependem de consentimento, por escrito, do locador. Não havendo na lei tal exigência, vale a manifestação tácita, que se infere da conduta do agente. Nas doações puras, por exemplo, muitas vezes o donatário não declara que aceita o objeto doado, mas o seu comportamento (uso, posse, guarda) demonstra a aceitação. O silêncio pode ser interpretado como manifestação tácita da vontade somente quando a lei der a ele tal efeito, como nos arts. 1.166 (doação pura), 1.293 (mandato), 1.147 (venda a contento) etc., ou quando este ficar convencionado em um précontrato ou ainda resultar de uma praxe comercial (CC, art. 1.084). Nestes casos o silêncio é considerado circunstanciado ou qualificado.
Como o contrato, por definição, é um acordo de vontades, não se admite a existência de autocontrato ou contrato consigo mesmo. O que há, na realidade, são situações que se assemelham a contrato dessa natureza, como ocorre no cumprimento de mandato em causa própria, previsto no art. 1.317, 1, do Código Civil, em que o mandatário recebe poderes para alienar determinado bem, por determinado preço, a terceiros ou a si próprio. Na última hipótese, aparece apenas uma pessoa ao ato da lavratura da escritura, mas só aparentemente, porque o mandatário está ali também representando o mandante. Este, quando da outorga da procuração, já fez uma declaração de vontade. Preceitua a Súmula 60 do Superior Tribunal de Justiça: "É nula a obrigação cambial assumida por procurador do mutuário vinculado ao mutuante, no exclusivo interesse deste". A razão é que tal situação configura modalidade de contrato consigo mesmo.
4. PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS DO DIREITO CONTRATUAL
Os mais importantes princípios do direito contratual são:
a) Princípio da autonomia da vontade - Significa ampla liberdade de contratar. Têm as partes a faculdade de celebrar ou não contratos, sem qualquer interferência do Estado. Podem celebrar contratos nominados ou fazer combinações, dando origem a contratos inominados. Tal princípio teve o seu apogeu após a Revolução Francesa, com a predominância do individualismo e a pregação de liberdade em todos os campos, inclusive no contratual. Como a vontade manifestada deve ser respeitada, a avença faz lei entre as partes, assegurando a qualquer delas o direito de exigir o seu cumprimento.
b) Princípio da supremacia da ordem pública - Limita o da autonomia da vontade, dando prevalência ao interesse público. Resultou da constatação, feita no início deste sécu lo e em face da crescente industrialização, de que a ampla liberdade de contratar provocava desequilíbrios e a exploração do economicamente mais fraco. Em alguns setores fazia-se mister a intervenção do Estado,-para restabelecer e assegurar a igualdade dos contratantes. Surgiram os movimentos em prol dos direitos sociais e a defesa destes nas encíclicas papais. Começaram, então, a ser editadas leis a fim de garantir, em setores de vital importância, a supremacia da ordem pública, da moral e dos bons costumes, podendo ser lembradas, entre nós, as diversas leis do inquilinato, a Lei da Usura, a Lei da Economia Popular, o Código de Defesa do Consumidor e outras. A intervenção do Estado na vida contratual é, hoje, tão intensa em determinados campos (telecomunicações, consórcios, seguros, sistema financeiro etc.) que se configura um verdadeiro dirigismo contratual.
c) Princípio do consensualismo - Decorre da moderna concepção de que o contrato resulta do consenso, do acordo de vontades, independentemente da entrega da coisa. A compra e venda, por exemplo, quando pura, torna-se perfeita e obrigatória, desde que as partes acordarem no objeto e no preço (CC, art. 1.126). O contrato já estará perfeito e acabado desde o momento em que o vendedor aceitar o preço oferecido pela coisa, independentemente da entrega desta. O pagamento e a entrega do objeto constituem outra fase, a do cumprimento das obrigações assumidas pelos contraentes (CC, art. 1.122). Os contratos são, em regra, consensuais. Alguns poucos, no entanto, são reais (do latim res: coisa), porque somente se aperfeiçoam com a entrega do objeto, subseqüente ao acordo de vontades. Este, por si, não basta. O contrato de depósito, por exemplo, só se aperfeiçoa depois do consenso e da entrega do bem ao depositário. Enquadram-se nessa classificação, também, dentre outros, os contratos de comodato e mútuo.
d) Princípio da relatividade dos contratos - Funda-se na idéia de que os efeitos do contrato só se produzem em relação às partes, àqueles que manifestaram a sua vontade, não afetando terceiros. O nosso ordenamento o acolheu no art. 928 do Código Civil, que assim dispõe: "A obrigação, não sendo personalíssima, opera assim entre as partes, como entre seus herdeiros". Embora tenham sido
mencionados somente os herdeiros, não são terceiros, em face dos contraentes, também os seus sucessores a título singular. Só a obrigação personalíssima não vincula os sucessores. O aludido princípio comporta, entretanto, algumas exceções expressamente consignadas na lei, permitindo estipulações em favor de terceiros, reguladas nos arts. 1.098 a 1.100 (comum nos seguros de vida e nas separações judiciais consensuais) e convenções coletivas de trabalho, por exemplo, em que os acordos feitos pelos sindicatos beneficiam toda uma categoria.
e) Princípio da obrigatoriedade dos contratos - Representa a força vinculante das convenções. Pelo princípio da autonomia da vontade, ninguém é obrigado a contratar. Os que o fizerem, porém, sendo o contrato válido e eficaz, devem cumpri-lo. Tem por fundamentos: a) a necessidade de segurança nos negócios (função social dos contratos), que deixaria de existir se os contratantes pudessem não cumprir a palavra empenhada, gerando a balbúrdia e o caos; b) a intangibilidade ou imutabilidade do contrato, decorrente da convicção de que o acordo de vontades faz lei entre as partes (pacta sunt servanda), não podendo ser alterado nem pelo juiz. Qualquer modificação ou revogação terá de ser, também, bilateral. O seu inadimplemento confere à parte lesada o direito de fazer uso dos instrumentos judiciários para obrigar a outra a cumpri-lo, ou a indenizar pelas perdas e danos, sob pena de execução patrimonial (CC, art. 1.056). A única limitação a esse princípio, dentro da concepção clássica, é a escusa por caso fortuito ou força maior, consignada no art. 1.058 e parágrafo único do Código Civil.
f) Princípio da revisão dos contratos (ou da onerosidade excessiva) - Opõe-se ao da obrigatoriedade, pois permite aos contratantes recorrerem ao Judiciário, para obterem alte ração da convenção e condições mais humanas, em determinadas situações. Originou-se na Idade Média, mediante a constatação, atribuída a Neratius, de que fatores externos podem gerar, quando da execução da avença, uma situação muito diversa da que existia no momento da celebração, onerando excessivamente o devedor. A teoria recebeu o nome de rebus sic stantibus, e consiste basicamente em presumir, nos contratos comutativos, de trato sucessivo e de execução diferida, a existência implícita (não expressa) de uma cláusula, pela qual a obrigatoriedade de seu cumprimento pressupõe a inalterabilidade da situação de fato. Se esta, no entanto, modificar-se em razão de acontecimentos extraordinários (uma guerra, p. ex.), que tornem excessivamente oneroso para o devedor o seu adimplemento, poderá este requerer ao juiz que o isente da obrigação, parcial ou totalmente. Depois de permanecer longo tempo no esquecimento, a referida teoria foi lembrada durante a I Guerra Mundial de 1914 a 1918, que provocou um desequilíbrio nos contratos de longo prazo. Alguns países regulamentaram a revisão dos contratos em leis próprias. Na França, editou-se a Lei Faillot, de 21 de janeiro de 1918. Na Inglaterra, recebeu a denominação de Frustration of Adventure. Outros a acolheram em 10 seus Códigos, fazendo as devidas adaptações às condições atuais. Entre nós, foi adaptada e difundida por Arnoldo Medeiros da Fonseca, com o nome de teoria da imprevisão, em sua obra Caso fortuito e teoria da imprevisão. Em razão da forte resistência oposta à teoria revisionista, o referido autor incluiu o requisito da imprevisibilidade, para possibilitar a sua adoção. Assim, não era mais suficiente a ocorrência de um fato extraordinário, para justificar a alteração contratual. Passou a ser exigido que fosse também imprevisível. É por essa razão que os tribunais não aceitam a inflação como causa para a revisão dos contratos. Tal fenômeno é considerado previsível entre nós.
O nosso Código não regulamentou expressamente a revisão contratual. Não resta dúvida, porém, de que o princípio de que a revisão pode ser postulada em razão de modifi cações da situação de fato foi acolhido. Com efeito, o art. 401 do Código Civil permite o ajuizamento de ação revisional de alimentos, se sobrevier mudança na fortuna de quem os supre. Podem ser ainda lembrados, como exemplos, os arts. 954 e 1.058 do mesmo diploma.
Na realidade, a cláusula rebus sic stantibus e a teoria da imprevisão têm sido aplicadas entre nós somente em casos excepcionais e com cautela, desde que demonstrados os seguintes requisitos:
a) vigência de um contrato comutativo de execução diferida ou de trato sucessivo;
b)ocorrência de fato extraordinário e imprevisível;
c) considerável alteração da situação de fato existente no momento da execução, em confronto com a que existia por ocasião da celebração;
d) onerosidade excessiva para um dos contratantes e vantagem exagerada para o outro. Em linha geral, não se aplicam aos contratos aleatórios porque envolvem um risco, salvo se o imprevisível decorrer de fatores estranhos ao risco próprio do contrato.
g) Princípio da boa-fé - Exige que as partes se comportem de forma correta não só durante as tratativas, como também durante a formação e o cumprimento do contrato. Guarda relação com o princípio de direito sobre o qual ninguém pode beneficiar-se da própria torpeza. Recomenda ao juiz que presuma a boa-fé, devendo a má-fé, ao contrário, ser provada por quem a alega.